segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Quero meu verso

Quero meu verso latente, meu verso imponente e sujo de lama.
Quero meu verso rasgado em qualquer sarjeta, estragado,
expelido dos lábios de um bêbado.
Quero meu verso esquecido, largado em cima da mesa de qualquer boteco.
Quero meu verso proclamando novos tempos de tristeza,
com versos claros de algodão, e se algum dia se tornar vão,
quero meu verso não, pois a fadiga deve tê-lo arrancado do peito.
Quero meu verso puro e inclemente, mandando flores à chuva,
descobrindo segredos de moça.
Quero meu verso cantante, cheio de alegria turva,
quero meu verso direto, cheio de linhas, cheio de curvas.
Quero meu verso amanhã pois só aprendi a ser depois,
quero meu verso em pares para que ele nunca se sinta só.
Quero meu verso ao redor da minha garganta estridente,
quero meu verso cortante, meu verso aguardente.
Quero meu verso trancado e cheio de não-me-toques,
meu verso as escuras, versos para cadela e para mulher madura.
Quero meu verso criança e cheio de futilidades,
quero meu verso saudade e cheio de destemperança.
Quero meu verso apaixonado e cheio de falsidade,
meu verso é minha cidade, meu verso é uma terra totalmente estrangeira.
Quero meu verso adulto e cheio de transparência,
quero meu verso idoso, verso adolescência.
Quero meu verso as avessas,
para mostrar o que há de bom e de ruim,
meu verso pra esconder-se sem pudor,
quero meu verso menino, menino cheio de desamor.
Quero meu verso estrela que brilha de dia e ninguém pode vê-la,
quero meu verso escrito pelas paredes da cadeia.
Quero meu verso intimo da tua pior vaidade,
do teu apego inconstante, da tua falsa verdade.
Quero meu verso agora pois não aprendi a ser amanhã,
quero a poesia vã em sua plenitude assustadora.
Quero meu verso em divã, sentado ou deitado,
meu verso desamparado e correndo para os braços de uma musa louca.
Quero meu verso aos poucos, para que a vida seja mais duradoura,
que meu verso seja vassoura, varrendo o que há de escondido em mim.
Quero meu verso e apenas meu verso há de consolar
essa alma clandestina que nessa vida se destina
a querer e mais nada.



Verde

0 comentários:

Postar um comentário